domingo, 16 de maio de 2010

Noite Escura


Em uma Noite escura, com ânsias em amores inflamada, ó ditosa ventura!, saí sem ser notada. estando minha casa sossegada.
A ocultas, e segura, pela secreta escada, disfarçada, ó ditosa ventura!, a ocultas, embuçada, estando minha casa sossegada.
Em uma Noite ditosa, tão em segredo que ninguém me via, nem eu nenhuma cousa, sem outra luz e guia senão aquela que em meu seio ardia. Só ela me guiava, mais certa do que a luz do meio-dia, adonde me esperava quem eu mui bem sabia, em parte onde ninguém aparecia.
Ó Noite que guiaste!, ó Noite amável mais do que a alvorada!, ó Noite que juntaste Amado com amada, amada nesse Amado transformada!
No meu peito florido, que inteiro para ele se guardava, quedou adormecido do prazer que eu lhe dava, e a brisa no alto cedro suspirava.
Da torre a brisa amena, quando eu a seus cabelos revolvia, com fina mão serena a meu colo feria, e todos meus sentidos suspendia.
Quedei-me e me olvidei, e o rosto reclinei sobre o do Amado: tudo cessou, me dei, deixando meu cuidado por entre as açucenas olvidado.
São João da Cruz

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